domingo, 26 de março de 2017
companheiros
Ao leste há um país muito parecido com o nosso. Nossa floresta e nosso deserto vazam um encima do outro como um belo bolo de mármore. As fronteiras são dois braços se roçando, os pelos arrepiados dão destinos ao vento. Contudo, não falamos a mesma língua. Não comemos as mesmas coisas. Não falamos um dos outros nas pousadas ou telejornais. Não trocamos bilhetinhos de amor, telefonemas, receitas, feitiços, frutas curandeiras. Não trocamos em gritos, como alguns vizinhos irritados, ou olhares, como os que definem a existência de uma grade. Nunca, nem se quer, nos juntamos na guerra. Na bebida exagerada ou naquele desejo humano e meteórico de contar segredos aos desconhecidos. Mas eu minto. Houve uma vez. Uma e única vez. Nossos governos caíram em derrocadas, os dois juntos, exatamente ao mesmo tempo. Os que assumiram no lugar não queriam um país. Mas sim um estrado. Uma dispensa de desmanches. Os que assumiram se juntaram, e no trabalho conjunto mataram e sumiram, e mataram e sumiram, com as pessoas tanto do lado de cá como do lado de lá. Hoje tudo voltou como era. Ainda sim imaginamos. Em algum lugar, enterrados embaixo da terra, talvez no mesmo buraco. No mesmo recife de coral. As pessoas do nosso país, e as do outro. Estão juntas.
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