segunda-feira, 10 de abril de 2017
em volta das cabeças
tiara, ele (você nunca usaria) disse. disse: que eu não estava lá. porque eu nunca usaria uma. o que? tiara. tivemos conversas sobre isso um dia. no meio de outro cacho de dias que conversamos sobre tudo, éramos íntimos a tal ponto, inclusive isto. esta coisa de falar dos objetos. como quem os acarinha para ver se acordam outras utilidades. convencer uma faca a ser outra coisa. isto. tiaras. mas fui. estava lá. vi o menino uruguaio fazendo seus malabares como se fossem o retrato de sua língua tentando falar as vogais brasileiras. a última hora de um conhecido, escolhido para beber chimarrão entre os amigos e tocar sua flauta. eu estava lá. a jussara, a lídia, o joaquim, o enzo, a agnes. também estavam e para provar isto vou dizer: bizarramente com a calça da mesma cor, um azul bebê, cor que pouca gente usa hoje em dia, menos eles, por coincidência todos no mesmo dia. vi nosso ex-colega escalar um morrinho de grama e simplesmente chorar. para que todos vissem. como uma bandeira. imune a vergonha ou fazendo da vergonha algo que desimuniza seus inimigos. nós o vento. a faculdade, fechando. nossos futuros uma rachadura no ovo. misterioso, o cozinheiro. um binóculo que caiba nesse cadeado, por buda! o governo acabando com nossa faculdade, nossa porque pública, nossa porque cenário das redes de olhares, dos cabelos perdidos, dos sonhos quando já em casa, em nossas camas. o governo assim. jogando os fósforos não tão acesos mas acesos, descartando em nossa universidade, até que tudo exploda e vá às favas. não tínhamos muito o que fazer naquelas tardes. tinham-se acabado, cancelado, as aulas. eu recém chegada do Peru, depois de uma tentativa de desvirar alguém que andava de costas (não deu certo, o outro lado, fazia seta para trás também). eu sei que ele não gostou disso. o meu amigo. o que não me viu. meu amigo. agora desempregado. há algumas horas atrás o umbigo de meu avião roçou seu duro casco nessa cidade. ele disse: vamos amanhã. eu disse. vamos. pra mim era um tanto mais sobre salvar nossa passado, antes que qualquer coisa. nossos quatro ou seis anos, para sempre miniatura em um dos corredores de nossa querida universidade nacional. para ele era sobre o futuro, principalmente ele. confundia o rosto com o campus. se expressam juntos. a boca, era o restaurante popular. os ouvidos a biblioteca (com quatro andares, pois são vários os caminhos da audição). eu sei. tanto é que fui. o procurei. sentei sozinha, um tanto afastada, direta na ex-grama, terra, puro marrom de mini planetas. úmido. longe dos nossos amigos. longe do último dia de meu conhecido, onde uma e outra vez, descansei os olhos em sua barba durante a argumentação gaga de um palestrante ou bêbado ou ambos. vi meu amigo, virei bigorna por dentro. virei rumo. me aproximei e ele me olhava, consideravelmente perto agora, e ele me olhava, mais menos longe e me olhava até que parou de olhar. era como se estivesse vendo tudo que não coubesse em meu contorno. não me reconheceu. simples assim. no outro dia conversamos pelo computador. tiaras, ele ainda insistiu. você não foi. você nunca usaria tiaras. já conversamos sobre isso. eu sei que está chateado. é lá onde guardamos toda a memória do mundo. você me confundiu comigo mesmo. está tudo bem. são múltiplos os andares.
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