quarta-feira, 30 de novembro de 2011

as bibliotecas

Talvez que agora não imaginaria como arranjar cem poloneses típicos, ou figurantes que se passem pelos tais poloneses, sem contar roupas originárias da Cracóvia do século XIX, sem contar com uma estação de trem do início da idade férrea brasileira, porque afinal de contas, eram-se necessários dois minutos de uma cena que era justamente essa: “enquanto na cidade de Ijuí os poloneses desembarcam ao fundo, Gestão ( o cachorro), segue aqueles que possuem as barras das calças mais apetitosas para seu focinho”.

Que agora só desviava a atenção para a falta de concentração, como o rastro dos caracóis embaixo da mesa do café, a menina que rouba dinheiro da própria mãe só pelo divertimento de superioridade, embora as chuquinhas coloridas, cuidadosamente arranjadas por uma mão estrangeira demonstre o oposto, a cerca da praça abaixada dividindo o chão com as pedras, a e olhe lá, um cachorro com patas finas e dorso preenchido, bigodes feito farpas e olhar imbecil, poderia ser ele o tal cachorro, o tal Gestão, será que se encaixa? as orelhas finas tal como descrito no script e a cor malhada para transparecer uma certa miscigenação que acabava em um tal de não-pertencimento, um devir no estrangeiro.

Que talvez eu fosse muito chata e minha própria natureza não era daquelas de pátio largo, de terra abundante, que permita a outros hastearem seus próprios guarda-sóis e cadeirinhas, piqueniques, que não entende um compartilhamento, uma presença, ou simplesmente uma conversa ( esse stage dos olhares que atiram e que quando acertam nada morre, mais vive, vive mais), um papinho de tarde, na praça, faz quanto tempo mesmo que não nos vemos? E o que mais reconheço é essa dispersão.

Uma conhecida falta de interesse. É de sol o dia, a mesa está na varanda tal como o palco de todos os domingos, os avós se sentam a mesa, a tia lúcida por loucura da doença, um gato (acho que Rodolfo o nome) sai do colo do pai para buscar com os dentes uma borboleta que tonta dá piruetas longe de um processo de brincadeira, mas sim de conseqüência de idade avantajada, e um pulo do felino é o bastante para que seu tempo pare de contar. O restaurante dos primos vai bem, as férias já estão planejadas, aspargos e azeite decoram o linguado irreconhecível pelas queimaduras que entende-se na travessa de madeira sobre a mesa. Ouve-se um grito, é a mãe, é só a mãe, sozinha no quarto impossível de andar, com um bolsão de água abaixo de seus pés, impossível de nadar, com seu reflexo de pavor no próprio espelho do líquido. Eram 13h15, seu irmão mais novo avisará que estava para chegar e você aproveitava a submersão de todos nessa história, para poder dar uma fugidinha rápida, andar lá pelo calçadão, encontrar um namoradinho quem sabe, o parelelismo de sons dos rolinhos de água no rio ao alcançar a margem com as de suas línguas suadas em giro, em busca do que todos prometeram que era divertido, que era o início do melhor.

Ou não. Mas sei que poderia ter sido assim, porque afinal, seu plano deu certo, todas as idades ficaram entretidas com sua mãe e seu irmão, vovô foi pegar a câmera, o pai correu para o quarto jogando tudo que era estampado com personagens infantis dentro de uma grande bolsa (depois de três filhos ainda não sabia do que precisava um recém-nascido), a avó tentava explicar para a tia o que estava acontecendo enquanto a tal doença não cooperava jogando a senhora para os anos 1900 e letrinhas, e eu me deixava chorar sem ninguém saber, parte por ninguém experimentar aquele peixe cuja morte foi em vão e eu ajudei a preparar com as medidas contadas em uma balança de cozinha, parte por não saber que eram esse irmão que estava chegando e o que ele queria. Claro que chegou um momento que percebemos que faltava você, onde estava você e tudo. Tio Anselmo foi atrás de você a partir das minhas informações garimpadas há muitas semanas, te encontrou por ai, a levou para o hospital. E depois do menino nascer, mesmo assim, todos continuavam dedicados tão somente a isso que nem papai lembrou-se de te dar um grito, uma surra, um interrogatório e até hoje não sei por onde você andou ou o que fez, foram tão poucas as conversas, diálogos de resumos.

E agora mantém os olhos caídos, no que poderia ser um sinal de submissão ou respeito, mas que na verdade é o signo de uma distância, de uma altura por onde seus pensamentos rodeiam, tão a cima, onde nunca poderei escalar mesmo com algum suborno em qualquer sentido. Me detenho em seus dedos enquanto um desses mágicos de rua nos escolhe para suas palhaçadas, como se não fosse fácil perceber que ali nenhum feitiço duraria, se instauraria com facilidade, não sei porque julgou que havia harmonia para ser quebrada e foi o que fez com seu rosto pintado, sendo constantemente remaquiado pelos novos cordões de suor, perto da testa, que não paravam se surgir, culpa do verão, culpa do trópico, culpa de uma maior intimidade com os baralhos do que com os seus planos. As suas cutículas são envezadas, não tão dóceis, você ainda não as tira buscando embelezamento, você ainda não se preocupa com as próprias decisões do corpo por ele mesmo. Seus dedos são cumpridos, são os dedos que sempre quis ter, aos quais associei a excelência no piano e no vôlei de praia, dedos como os da tia Irene que hoje ninguém mais lembra mas se te olhassem, recordariam do jeito delirante e despreocupado que aquela mulher possuía de tocar gaita nos bares do interior, músicas em francês recheadas de cenas de bordeis, histórias trágicas de prostitutas, sexos que deram bem sexos que deram mal, mas ninguém entendia mesmo, embora gostassem muito o público do bar Veneza, o principal de Eldorado. Tão grande é essa aversão, ou até mesmo, essa agressão com seu corpo, e mesmo assim você permanece contentora de uma beleza assustadora que as pessoas não entendem, e assim gostam ainda mais.

O mágico continua com suas palavras mal conjugadas, das quais eu nem percebo, até o momento em que ele resolve levar o braço perto do seu rosto, sua mão chega a tocar o lóbulo de sua orelha direita, você meio que ri nervosa não diz que não gosta, e daquele contato ele tira uma moeda de prata da republica Del Uruguay, muito antiga. Bastou um movimento tão clichê para ele tocar em você, uma desculpa tão pouco engenhosa, rotineira até. Conheço até bem a capacidade de seus ouvidos, a hora em que você os desliga propositalmente dona de grande insensibilidade, ou quando eles trabalham como uma folha, recolhendo apenas as manchetes que os interessam. Mas de fato a curvatura de suas orelhas e o caimento pós-cartilagem, aquela coisa sempre em queda onde de vez em quando você usa do brilho de um brinco para demonstrar um amor-próprio, um chamamento, eu desconheço por completo, ainda mais com nossos braços sempre faltando uma finura para um encontro, sempre algo está nesse entre, uma avenida, um cabo de telefone ou essa mesa, na qual agora nos encontramos.

Foram dez minutos que se foram, gastos por um fósforo desconhecido, sem nenhum peso fecundo o bastante para não levitar da memória. Mas posso jurar que você tenha gostado dessa intromissão, aliás, o acaso sempre te tratou como uma filha querida, uma pupila, sempre com olhos de conforto, bóias estratégicas em cada geografia, agasalhos correspondentes a térmica de cada dia, de cada situação. Uma bolsa de estudos em Cuba, os lábios tidos sem esforço das presas, a exposição de Velásquez justo naquele dia, a desenvoltura social típica dos bons malabaristas. Claro, as dificuldade também. Sempre postas em lugares estratégicos, com cabines de emergências e ambulâncias a fazerem a escolta de seus passos. Um braço quebrado aos nove, um acidente de bicicleta aos 14, uma quase gravidez aos 16. Uma tristeza daquelas sem sal, fácil de se afogar, como uma marca de nascença impressa nas irregularidades da pele, salvo o aparecimento de qualquer tentativa de esconderijo. Porém diferente nesse sentido. Você gostava de a exibir, esbanjar uma solidão para todos, um tipo de solidão que fazia de você intocável e atribuía a ti a impossibilidade. No Santa Inês, as professoras só reclamavam das temáticas das redações, sempre com alguns neologismos trava-línguas e algumas vezes caindo ao ilícito, pervertido é a palavra, mas as notas se mantinham acima da média com o mesmo esforço de um ser de asas a pairar a favor de uma corrente de ar, não incomodava no geral, tinha uma oratória desenvolvida com assustadora segurança se comparada a falta de maturidade de sua formação dentária, mantinha um fôlego saudável para os esportes, se dava bem com a maioria dos estudantes, embora meio estranha dentro daqueles par de calças jeans Levis apertados e camisetas picotadas a exibir em sua estampa a discografia, variando o dia, dos anos setenta por inteiro.

Claro que eu não entendia. Aliás, quando eu nasci você já existia por completa. E sobre você, eu nunca soube o que pensar. Observava equilibrada na pura atenção, por exemplo, a sua maratona cotidiana: o levantar às 7h45, o alongamento das pernas com o auxílio da pia do banheiro, o lavar a cara sem olhar a cara, a música soando de sua direção (hoje sei que a maioria delas é de autoria do Caetano), o chá rápido e a saída pela porta da frente sem nenhuma palavra solta com endereço humano. Acredito que nesse sentido, fui a sua primeira platéia fervorosa, e estava sempre presente. Ao mesmo tempo que essa ausência se construía, você estava tão presente mesmo quando não voltava para casa. Já vi mamãe sentada na cama a encarar as pernas sem ver, chorando vagarosamente com uma delicadeza controlada, uma impressão de costume, e do vão da porta sabia que aquele vermelho dos rosto era sua obra.

Na casa da vovó, tenho certeza. Eu tentava ler um livro seu, de Murilo Rubião, permeado de anotações elaboradas em qualquer espaço do vácuo da tipografia, tentando no vocabulário dos onze anos encontrar uma representação de mundo a partir daquelas palavras. Vovó e mamãe conversavam sobre Estéfano, nosso irmão há cinco anos. As crises de asma assustavam, além disso, havia alguns problemas com seu coração. Apesar de sua saúde incompleta, foi ao falar de você que vovó sentou-se mais perto e pôs-se a fazer calor com suas mãos em colcha nas mãos de mamãe. Era isso um medo de te perder de qualquer maneira, sem nenhum motivo que se demonstrasse sólido, acredito.

Tinha medo de você me ver como adversária, ou não reconhecer no meu rosto, os olhos e cabelos claros tão inexistentes em ti, uma familiaridade óbvia. E o próprio ato de conversar com você me fazia às vezes sentir um resfriado no peito, uma pisoteada quente no rosto, um planejamento prévio, antes de dormir domar as palavras com a cadência e conteúdo estudados como receita, para garantir sua aprovação. Mas independente de minha geniosa obra frasal, a sua resposta era sempre com palavras curtas e breves sem a companhia de um visto compenetrado. A atenção de seus ouvidos tinha de ser disputada com tantas outras coisas de seu interesse que eram mais importantes para você do que eu, o que fazia de mim sempre uma fazedora de incômodos, um atraso sem escalas. Ainda lembro, em uma vez rara vez, que nasceu e morreu no mesmo dia, você me disse - enquanto uma lágrima armava-se no encontro de suas pálpebras rochosas e branquiadas – “a coisa mais importante no mundo que você pode dar para alguém são seus ouvidos”. Naquele tempo infelizmente eu ainda não tinha idade para seriedades, mal escutava o desaforo de seu rosto e garganta, segurando aquele pastel de queijo, onde até o momento eu procurava o queijo, que eu suspeitava já estava extinto antes mesmo do surgimento do pastel, com os pequenos dedos habitados pelo relevo das primeiras aulas de violão, nada entendi. “É preciso ouvir com os olhos, ou até a pele, o corpo todo, menos com os ouvidos”, dizia você, e eu nem percebia que aquilo era obra de uma tristeza que traz consigo um esclarecimento. Mais tarde aprendi que respeito para você flerta com desprezo, e passei a testar isso em toda oportunidade que surgia.

Talvez que seu vôo poderá atrasar amanhã, mas mesmo assim é preciso chegar antes ao aeroporto, São Paulo precisa de você no dia seguinte em pé e com café tomado. Talvez que ainda falta visitar Cleo e Vitor, Magali e Núbia, e tomara que essa última ande melhor, que você não agüenta mais tirar conselhos de onde não há para que ela saia daquele apartamento e descave do quintal da desistência todas as coisas que importam. Talvez, entre uma colher e outra do chessecake de amoras, você olhe para mim rapidamente, esparrame o olhar no curto dos meus cabelos, faça graça do aro de meus óculos, e até respeite a minha tentativa de tentar parecer interessante. Temo um medo de no fim, ter me tornado muito parecida com a mulher que você sempre foi, um tipo de aço que não serve para construções, uma represa infértil, uma felicidade enjaulada, uma proteção que imita as das garras. Esses olhos com o enquadramento de uma cela que não existe, a emoldurar momentos mas não os deixar visíveis em nenhum corredor, a ninguém. Mas eu sou a pessoa que ficou, provavelmente, a que sempre vai ficar, e você, uma burladora de muros, mesmo que tenha todas as chaves, todos os códigos, apela pelas fugas, aquela que não reconhece o portão de sua casa no quarteirão, aquela que sempre vai embora.
Estamos agora em nossa cidade. A cidade em que você cresceu e abandonou, a cidade em que eu cresci já no seu abandono. Tantos cinemas novos aconteceram e sumiram pelos bairros, tantas coisa que não chegou até você. Eu resolvo pedir mais uma água e você também. O garçom mais jovem do que nós duas resolve estender a nós um convite e conversa. Pergunta se somos daqui ou estamos apenas de passagem, se viemos para a Bienal, ou talvez a Feira do Livro, se já vimos alguma peça legal da cidade e encaixado nisso, tudo na mesma chance ele acrescenta, que uns amigos estão na temporada com uma peça bem “legal”, algo baseado em Vera Karam ou coisa assim, mas que ele recomenda e se necessário, até nos acompanharia em alguma sessão. Eu apenas respondo que somos daqui, enquanto você, diz que está de passagem e que já perdeu seu interesse por montagens da Vera, há um bom tempo. É incrível mas percebo que até o garçom, talvez nem ele saiba, mas está puxado por você. E se ele resolvesse me perguntar algo sobre ti, quando eu for ao banheiro ou algo do tipo, se ele tocar na sua intimidade, eu não serei útil em nada, por pura ignorância de assunto. Você nunca chegou até nós com um namorado, a notícia de um namorado ou algo do tipo. Embora mais tarde eu tenha conhecido pessoas que estavam atrás de você, nunca te vi com ninguém e das tuas relações só conhecia alguns amigos de vista. O garçom ficou um tempo em silêncio, e pergunta se somos irmãs. Admito que me surpreendi, e o espanto inicial me deixou toda mudez. Olhei para você, à espera da resposta, que veio ao natural, um simples sim, sem nenhuma pitada de desdém. Me pergunto de onde ele tirou tal idéia, como ele percebera isso de uma ausência de sinais. Um silêncio tímido e duas anatomias tão diferentes não o levariam para esse caminho. Quando ele enfim retorna para seu trabalho, percebo que o conheço, é um amigo de Estéfano, do tempo do colégio. Nem deve saber que ele está morto.
Eu te pergunto porque não foi visitar nossos pais, você mexe na bolsa até lembrar que o cigarro largou por uma promessa, há algumas semanas. “Você não sabe como são essas coisas, não posso ir lá, ainda”. Você me subestima, como se eu não tivesse condições de entender o seu medo. Conheço seu medo e o tamanho exato para a cova desse. Mas calo-me porque não te quero triste agora. Para mim, pouco importa as tuas visitas a terra natal as tuas demonstrações de afeto, não sofro mais, mas sim os outros, os que não desistiram. Começo a repensar a idéia de vir aqui, te encontrar nesse café, como se fossemos tão chegadas e isso fosse um costume. Começo a detestar essa vista que levarei ao fechar os olhos, o Guaíba sem nenhuma agressão do vento, o cais beneficiado pelos arames soltos pelo sol. Começo a detestar a ti, sem reconhecer nada em teu corpo, com vontade de entender a espessura de tua pele pela ação de um tapa, um soco. Queria me levantar e colocar minhas mãos ao redor de sua cabeça, a firmando contra a minha, controlando a quantidade de luz de tuas pupilas, a tua visão e se possível teus pensamentos, e depois, ir embora, leve. Você resolve tentar uma conversa, vejo que sua saliva se esgota antes de começar a falar, está nervosa. Fala que leu meu livro mas não gostou do final, que realmente, pensamos a vida por lentes de tamanhos bem diferenciados. Comentou que reconheceu algo nos personagens, e principalmente, se identificou um pouco em Virgínia, aquela negligência consigo própria, e uma solidariedade velada, até vergonhosa com os ademais, um desejo de posse por aversão, um pacto com o tempo de ele não esquecê-la em vão. Eu permaneço inerte, tentando descobrir o que você realmente quer falar, até que mudando de assunto e de órbita geral, você me pergunta, na tentativa de uma normalidade de fala, “como estava o enterro?”. E viajo por completa par o mês do outono, junho, um dia mal-morado, com tendência de agressão pela chuva, o silêncio das planícies de gelo, todos com a impossibilidade de encarar uns aos outros, vovó ainda viva resmungando baixinho protegida pelo braços de um de nossos primos, papai depois de promover murros na parede do hospital a utilizar as mesmas mãos, agora com alguns machucados a cicatrizar, para abraçar mamãe, em especial tapá-la os olhos. Eu acertando os últimos detalhes na secretaria, como se aquilo tudo fosse um show eu o produzisse nos mínimos detalhes. Volto e re-loco o olhar a sua face, tranqüila, lhe digo “como todos os enterros de garotos jovens, triste e assustadoramente injusto”. Não dou mais nenhum detalhe, não a passo o conhecimento desse sofrimento, como é saber que o coração possui um tempo físico, de relógio, e cada dupla batida corresponde a um segundo a menos de um estoque com nível à baixo do normal. Você estava aonde mesmo? Marrocos, filmando uma reportagem sobre colonização francesa, rodando um filme no interior de Moçambique, cercada de morte por todos os lado, do pior tipo, a morte em potencial. E pegar um vôo, e o tempo, e o contrato, e o incomodo. Agora você me aparece e pergunta sobre esse irmão, sobre o meu, inclusive. Voltamos ao silêncio das construções antigas. Os passos que por mais leves geram chiado nas madeiras velhas. Claro que você já pode ir embora. Claro que já se passaram três horas e nós insistindo.Por algum motivo você veio a essa cidade e resolveu visitar só a mim. E agora, tento adivinhar quase como um divertimento a hora exata que você se mostrará realmente você e partirá com uma das desculpas sorteadas de seu armazenamento mental elaborado empiricamente ao comprimento dos anos.

De alguma forma, agora te olho e sei tudo, mas você não se assusta, permanece intacta como uma árvore antiga após a passagem da cor cinza-escuro pelo céu. Há algo que nos aproxima e que dividimos mutualmente, o mesmo algo que nos faz permanecer em silêncio sobre essa mesa, sem vontade de abandonar esses assentos, praticando o ato de permanecer à mercê de uma impossibilidade que só a insistência pode trazer, de preferência uma de bico longo e faminto. É um tipo de desespero que nos impede de levantar e decidir por uma entrega ou um abandono, pelo encontro ou pela despedida e transforma nossas pernas, nosso movimento contido, em âncora e chão. E se a falta pode preencher, foi em nossa família que ela explorou suas formas. Herdamos eu e tu o medo da correspondência, mesmo que fechar os envelopes já seja uma maneira de ler, mesmo que o desvio já seja uma maneira de dependência, a nossa ligação está em cada tentativa de corromper os fios, em falhar a voz.

Nunca é fácil fazer parte da história de alguém, o passado nos rebaixa a meros leitores, é um livro que ganha suas páginas nos olhos dos outros. E nós somos aquelas que escutam pelos olhos, lembra?, uma biblioteca inteira nos impede de sair dessa mesa.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Não sofre não rapaiz. Aqui num tem mar não, mas alma da espuma sobra em marca nos monumentos.veja por você. Nessa cidade, à leste, alguns graus adivinhados, dois janguadeiros se esforçam pra não anoitecer junto com a tarde. Levantam caixas de papelão com a mesma força que atenuam quando tocam suas esposas. Os olhos vermelhos do encontro com o sal, aqui também há, um cansaço que incha a visão de ficar tanto tempo submerso. Meus peixes favoritos comem mel com pão batido em lanchonetes de azulejos Empretados e ventiladores de teto. Em minha frente três deles liberam palavras e riem mostrando o perigo dos dentes. O da direita admite, já foi, mas hoje não é. Enquanto o do fundo, que antes escutava guardando, mas hoje não quer, limpa a boca com um gole de cerveja amarela. Nenhum sabe, falo por eles, e o de barbatana mais arrugada deixa no ar: “nunca saberemos”.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Characters

Against the second chance,
Weapons gain memories
And blame the years and the ears
For have no excuses,
No excuses to continuity.

Deep, this stantion grows,
So many runners for just one road
The body always under construction
Expel the skin’s farmers,
Expel who travel inside the blood trees.

Give him, awards for the falling dances.
Give me, the engineering of the immobilized rock.

I cannot ever be your home and
He cannot ever give me your sand.

Some castles constantly need
The threat of the sea to be filled.

This is the promess of freedom
who lives in all destruction fabuly.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

porque não atravessar a rua

Se você visse meu cachorro agora. Tomando a arquibancada dô mundo. Apostando. O dia aguarda a facada que é a marcação do final de turno. Atrasada demais para meu cachorro. Ele me aguarda na porta do serviço, triste. Não quer saber de retícula de notícia. Das desculpas que arrisco às bibliotecárias. Me conhece o danado. Olha para mim. Sim cachorro, eu estou viva. Conforta-se com um instante de certificação e parte pra casa. Não confia em mim de proteção. Meu cachorro me aguarda, no meio do caminho. Patas intranqüilas no degrau, rabo ventilador, cansado de esperar. Ter que me buscar na noite assaltada por dificuldades. De novo, me vê e parte. A, se você pudesse ver ele antes. Deita no tapete, já fez seu trabalho, que desastre devo ser pra sua vida, pra que tanta preocupação. Eu olho. Mas olho reto, sem desvios, para ele ter certeza. Ele fingi-se desentendido. Sou um cachorro, desconcentrado, sabe que não entendo nada. Olha para um canto, limpa com os olhos toda janela das vistas. Desiste e se levanta, coitado. “vamos” eu digo acrescentando pressa. Ele levanta-se, me ultrapassa e sobe as escadas. e eu muda. Sabe que não ganhará muito com isso mas interpreta igual, nada mais a se fazer. Já no andar de cima, lanço algumas desculpas. Procuro amaciar orelhas, ele desdenha. Já está farto de meu discurso, das promessas tantas. Abro o refrigerador, peço para sentar. Apelo para desespero, lhe ofereço uma bolacha. Ele não vibra um músculo. Nem sequer salienta as despintadas narinas. Meu cachorro não agüenta mais meus costumes. Sou previsível. Mas lhe dou a bolacha, é óbvio. Ele mastiga, devagar, como nenhum animal do mundo faria. Digo que gergilim faz bem para o intestino e finjo ficar feliz por ele não devorar rápido todo volume da minha oferta. Alerto: limpe tudo, e aponto ao chão. De novo, finge não compreender. Dura pouco. Lambe as migalhas do piso apenas enquanto fiscalizo.
Mas o pior momento, o resfriado momento mesmo, o viral do gripal, é quando meu cachorro, depois de ter checado todo apartamento, identificado todos novos objetos, localizado os ausentes, mapeado a bagunça, não vai embora. E eu penso, cachorro, minha irmã menor está lá embaixo, na fase da reticiência, você não vai cuidar dela? Ele deita perto da escada. E eu penso, cachorro, porque tu se deitou e não fechou os olhos? Porque me observar tão insinuoso e desconfiado? A, se você visse me cachorro agora. E eu me finjo de desentendida. Pareço desconcentrada, olho par um canto, varro o entendimento para os laços da parede. Sabe que não sei de nada, não raciocino muita coisa. O cachorro me olha, sem deslizes. Abro o computador, abro uma cerveja, mexo nos rascunhos. Ele se mantém. Firme. Deitado, mas, de olhos abertos. Ao lado da escada. Como que clama: me diga agora. Fale tudo. Eu sei, o que está passando, mas é verdade? Não acredito. Desminta. Se for eu vou embora. Estou a um passo do primeiro degrau. Como me lembrasse. Olhe para mim e veja essa tua vida que só se recicla para virar madeira de cerca. Meu cachorro, se vocês o conhecessem. Ele é tão depressivo. Pouca coisa o alegra. O demos roupas. Ele rasgara todas e só depois desse menosprezo, as vista. Pensei, mas que solidão meu senhor. Lhe dei um gato para fazer companhia. Ele o gosto de um jeito estranho, o dando suprema liberdade,nem bola. Estava demais ocioso, o dei uma ocupação: entregador de papel higiênico nos banheiros, vigia noturno. Mas nem a fofoca dos galhos e do vento o faziem latir. E agora, ele afirma com os lábios caídos, deixe eu te reconhecer e entender o que se sucedeu. Então é mesmo o que me contaram. Olhe para mim e veja você.
Fumo um cigarro. Penso no que fazer antes que a cama cobre minha fiança. Vou até os livros. “Olhe que ridículo você parado. Não me dá um abraço nem nada. É só mais um que me critica” Vou até ele. Meu cachorro está rodeado de livros. Ele sabe Ele sabe dos livros. Não se move, não tem curiosidade. Juntou todos os triângulos, descobriu a deformação. Não há surpresas para meu cachorro em relação a mim. Chego perto perto, seduzindo-o para um carinho, uma roçada de pelo na minha perna, que seja. Nós somos esse silêncio complacente. Meu cachorro percebe que eu entendi, não há mais nada a se fazer, é uma bocadinha de pena. Ele espera eu começar a escrever esse texto, e der repente, se distância por entre as curvas da escada metálica. Magoada, sou orgulhosa. Não grito, exijo socorro. Finjo que choro, choro alto com nó na garganta, feito fazem os cachorros. Ele ignora, é preciso ir embora.
Pouco antes de me dar conta de sua ausência, percebo, eu e meu cachorro nos conhecemos muito bem, percebo, eu realmente estava falando com meu cachorro. Ele, respondendo. Meus pelos pressentem tudo. Nem a fofoca dos galhos e dos ventos nos fazem latir.
Se você me visse agora.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Ícaro era o nome do grandalhão. Analisava com espanteza a simples caixinha de papelão, culpada é verdade, de sufocar aquela parte do gramado se ensaiando amarelo. Foi ele, antes de Mathias se pronunciar, aliás, desembocar o grito longo, que primeiro chamou a atenção de todos. Naturalmente, através da estranha imobilidade de Ícaro, sobrancelhas difíceis de se impressionar, os primeiros que chegavam naquela parte dos fundos do terreno de Elenice, sabiam de imediato que aquela não se tratava de uma simples caixinha de papelão. E inertes pelo mistério que havia congelado até o mais velho dos componentes de sua confraria, nada fizeram procurando motivos apenas com o silêncio. E então, é claro, veio o tal grito de Mathias – esparso e fantasiado de injeção, como tudo que vem das crianças. O menino se agachou, e com apenas dois de seus dedinhos vazios de atleticidades, abriu o objeto amarronzado, expondo a todos o interior.

Úrsula, como se reagisse ao cronômetro de uma fera esfomiada, procurou o peito de Gilberto, o magrinho que estava no seu lado no momento, e ali ficou. Gil, por assim mais conhecido, quase renegou a violência daquela tal liberdade - a menina a começar chorar estampada na sua pele - mas ao entender o que de fato acontecera, agarrou-a firme, e daqueles que lá estavam, foi o único que chegou a ter uma certa sensação de felicidade, quando as nascentes dos seios da menina revelaram seu avantajado volume durante a pressão entre os corpos. Em paralelo, o hondurenho Yann sussurrava baixinho algumas palavras em francês que se assemelhavam a uma oração, enquanto Milena e Sampaio corriam com lágrimas desenhando rotas, cada um para sua casa, perdidos. +

Lembro que a manhã estava jovem ainda. No sábado, depois de desistirmos da partida de vôlei, , no asfalto da rua Domingos, resolvemos ir para o matagal de Elenice, aproveitando que a velha não estava em casa, apenas porque era proibido e talvez perigoso. Mathias sempre tinha esse tipo de idéia, que todo mundo sempre achava que vinha da cabeça de Ícaro, porque ela só acontecia se ele concordasse. Gil gostava de cobras, então achou uma boa sugestão, e concordou ao mexer em uma franja que não mais existia desde que seus morenos foram raspados num surto de lêndea, ocorrido na semana anterior entre as crianças da sua família. Milena acrescentou que seria uma ótima oportunidade de nós procurarmos por madeiras para a construção, que estava a ser planejada, da sede do grupo – e Úrsula completou dizendo que talvez os resultados fossem maiores que o esperado, seria até capaz deles encontrar ao invés de madeira, satisfações maiores, como por exemplo, algum tesouro escondido nas cobertas de terra, o que os dariam capital para comprar quanta madeira quisessem. Até Yann disse que sim, até porque, sabia poucas palavras no português, e arriscou essa por achar não mais adequada a situação, mas por ser ela a mais engraçada dentre os termos estrangeiros que decorará com dificuldade. Então, fomos nós todos rumo a aquele abandono todo antes que o sol se esconder-se.

E lá estava, caído entre raízes fortes e folhas com cores que só o outono traria as folhas. Foi Sampaio que o achou. Estava sozinho e gritava demais, o pobrezinho. Não por ter o melhor ouvido mas sim a maior curiosidade, o pequeno insistiu em descobrir a origem daquela torneira de sons esquisitóides. Ao o ver, Úrsula criou cordilheiras de felicidade com as bochechas. Mathias repetia “eu falei, eu falei pra gente vir, não é?”, enquanto Milena declarava a Ícaro, “que bom que a gente veio, que idéia! Vamos salvar o bichinho”. E de imediato, pensando que o motivo do resmungo do animalzinho fosse o excesso de frio, a menina espichou as mangas de sua camisa e encavernou o pequeno com o algodão que sobrava dos braços. Todos queriam tocá-lo, fazer um carinho, ser íntimo do corpo do bichinho, ser seu amigo, um pouquinho pai também. Concordamos, acho que eu até que sugeri, em batizá-lo de Pêpe. Lembro que começarmos até a criar uma história para o recém chegado. Seu pai sumira de casa em busca de trabalho e comida, e nesse intervalo, a mãe ficara enferme e fraca, vindo a desmaiar na boca de um predador qualquer, e Pêpe, o quase órfão, fora salvo pela nossa chegada, uma benção do destino, ou simplesmente, salvação nossa.

Logo começara a escurecer e todos sabiam que deveriam ir para casa em breve. Quando foi levantada a hipótese de quem ficaria com o pequeno, todos foram criteriosos. Ícaro já tinha três pastores alemães, o pai de Milena detestava animais (a criança nunca pudera ter nada de patas ou asas), Sampaio era alérgico, eu já tinha que cuidar de duas gatas, Mathias possuía em casa peixes, rãs e porquinhos da Índia que lhe ocupavam muito de sua paciência, Úrsula era instável e Yann, ora Yann, não tinha espaço de sobra na sua pequena casa, onde vivia parentes tanto por parte de mãe como de pai, sem contar os amigos refugiados de ambas as partes. Além disso, capaz da criatura aprender o francês, e vir a se sentir excluído no meio de todos, nas conversas futuras. A decisão do que fazer surgiu por parte de Milena, que trouxe à tona uma possibilidade encantadora. No outro dia seria o aniversário de Pedro, e bem que Pépe daria um ótimo presente ao rapaz. Mathias e Gil logo concordaram, sabendo que seus pais não haviam comprado nada para que eles dessem de presente ao amigo. Úrsula ficou cambaleante. Bem sabia ela da atenção que Pedro dava as suas coisas, e pior ainda, as coisas do outro. Não fazia muito tempo, o rapaz quebrara sua raquete novinha, quando ela esqueceu o brinquedo na sua casa. “Durou dois dias”, pensou mas deixou-se ir. Fora resolvido que essa seria a última noite que o animal passaria nesse acampado. No outro dia, Sampaio e Yann voltariam ao local, cuidadosamente, de manhã antes da velha tomar seu café. Levariam o animal à casa de Úrsula, onde ela o arrumaria apropriadamente para o encontro dele com seu dono, e após, Gil e Mathias o embalariam numa cesta bem bonita, feita com o que sobrou da decoração da Páscoa. Estava feito. Rapidamente, eu trouxe uma caixa, que encontrei por ali perto. O bichinho fora posto ali dentro, junto com fiapos de grama e pedaços de galho. Todos se despediram recheados de fôlego e cuidado, enquanto Mathias lacrava a caixa com os apetrechos que sempre guardava no bolso. Escondemos nosso segredo debaixo da copa da maior árvore do terreno. Não tinha erro. Voltamos todos para nossas famílias, onde comeríamos e iríamos para cama. Não sei se algum de nós realmente conseguiu dormir depois da luz ser desligada por força paterna. Estávamos ansiosos e reticentes com a distância exigida pela troca de dias em relação ao nosso animal. De qualquer forma, o tempo passou agradável, com a certeza de um dia agradável e de festa que nos esperava bufando.

E como tínhamos motivos para o sono nos ignorar. O que nos apresentava o domigo, naquele tempo, era isso. Pelo entorno, rasgos da fita que Mathias usara para preservar tão bem a casinha temporária do animal. Pelo chão os gravetos que Yann despejou com uma meticulosidade extrema. A caixa aberta, recebendo a luz do fim da manhã. Me recordo de perceber alguns pontilhados profundos nas abas do papelão marrom. O animal bem que tentara fugir, mas não conseguiu. Ficou registrada ali, a sua tentativa. Nosso crime estava exposto à céu aberto, tudo naquilo nos incriminava. Assim, enquanto Sampaio e Milena procuravam consolo dos pais em seus quartos, resolvemos ficar no exato lugar, em pé, erguidos pela raiva de nós mesmos. Olhei para para Mathias, procurando a exclamação de uma idea nova, que nada. Aguardei algum sinal de Ícaro, nos indicando funções a desempenhar, o que fazer, em vão. O animal parecia muito pequeno para conter apenas em si mesmo o tamanho da morte. Eram poucas as penas recém crescidas. O bico tão pequenino, a garganta sem tempo para se encorpar. “Isso não devia ter acontecido, não devia”, exclamava Úrsula ainda sem ter coragem para voltar os olhos e enxergar o corpo. Permanecemos ali, procurando motivos, tentando com a nossa vida exagerada, ressuscitar o pequeno com corpo frio, ao qual tudo que demos foi a morte. Parece-me que foi enquanto Gil tentava inventar razões “ele já devia estar fraquinho, não havia nada que pudéssemos fazer”, bem quando, acreditem, um arrependimento liquido brotou nos olhos de Ícaro (e o gigantão nem preocupou-se com o descrédito do ocorrido), na hora que Yann terminava sua oração “ainsi soit-il”, no momento em que Mathias acariciava a ave, o pássaro que nunca chegara aproveitar a liberdade máxima de suas asas, com seu dedo mais pequeno para não aumentar o estrago, que ouvimos alguém gritar de longe, era a mãe de Pedro a nos chamar, “Está na mesa meninos! Venham rápido para não esfriar”.

Naquele dia Pedro ficou muito bravo com todos nós. Pensou que tínhamos desdenhado sua festa, a comida de sua mãe, tudo, sei lá. Fomos, é claro, mas brincamos pouco. Nenhum de nós almoçou e sequer chegamos a sentar na mesa com seus familiares. Parece que Ícaro mesmo, foi o que se saiu pior. Chegou até a vomitar mais tarde, quando a mãe de Pedro, Lourdes, uma bela alemã de pele explícita, lhe direcionou a palavra dizendo “Você tem certeza que não quer uma asinha de frango?”.

Se mantiveram quietos. Mergulhadas num tipo de silêncio, tal como os de funerais.

domingo, 17 de julho de 2011

saias de casa ( quando a mulher sai de casa)

1.
A mulher saiu de casa esquecendo-se do fim de sua chegada. Seguiu a risca os mandamentos da coluna assim como obedeceu o risco dos dias de chuva. Entrou em duas poças de água. Entrou em dois olhos azuis. Entrou em algumas centenas de nuvens de fumaça. A mulher não havia levado luvas, guarda-chuva ou sequer bons pensamentos. Costumava ver tudo como geometria, a da brisa por exemplo, era a forma da lâmina. A mulher que saiu para achar não teve o que queria. Primeiro vieram as lancherias. Depois vieram as surpresas da esquina, como galhos caídos e instabilidades da superfície. Depois um conhecido, que recentemente voltou de Malta. Escorregou pela conversa ruim de senhoras idosas na frente da previdência. Se encarregou de imaginar o filho bêbado do motorista que pelo que enganchou da sua conversa com o cobrador “está como se equilibrar em paredes”. Expandida mas não completa, relinchou um sorriso que eu vi sim senhora. A mulher desafogou-se, e já chegando em casa, lembrou que esqueceu o motivo de enfrentar a chuva, a idade, a metrópole azul. “Menos uma coisa” – pensou, e girou a chave, satisfeita.

2.
A mulher saiu de casa, mas a casa não saiu da mulher. O bolor da casa prosseguiu, o gélido do espaço cama-entre- chão, continuou. A mulher tinha tido até o instante 43 tentativas. Todas estacionadas em vagas proibidas. A mulher tinha uma cota diária de lenha para aquecer futilidades. A mulher tinha tios fantasmas em épocas de sonhos fortes. Se foram todas as abordagens do interesse. Todo dia escuta sons que vem no campo, embora more na cidade, todo dia reza com os olhos abertos e alto, como se num palanque. Os cabelos envelheceram a idade, ninguém adota culpa por nascimentos. Especialmente, os da morte. Só assim mesmo, pra mulher sair de casa.
3.
A mulher saiu de casa na calada. Pés de gelo, fortificavam a imagem do todo, corpo de avalanche. A mulher fugia. Contaram uns, quando em namoro com o álcool. A mulher se esquecia de interpretar - garantiam os donos de poses com cabeça cheia. A mulher mudou a casa de lugar. Afirmavam os passantes, sempre os mais atentos. A mulher não achava justo usar martelos pra feitura dos quadros. Fazer estratégia em dias muito claros. Esconder as palavras por garantia. Ficaram os parentes a dedilhar restos nas roupas que continuaram, nos objetos de higiene. Ficaram os cães a latir e dormir, como sempre fazem os cães, independente das molas do mundo. “O jeito que a gente apaga é escrevendo” – o vigilante da madrugada garante ter ouvido, enquanto, pasmem, a mulher se preocupava em lacrar a porta da casa da qual nunca voltaria a estar, mas conferiu todas tranas, das janelas, portas, de todo andar, antes de meter-se a partir para sua vontade vencedora e cheia de si. Reluzente.

4.
A mulher saiu de casa por um mínimo instante, um assombroso meio metro quadrado de tempo, imperceptíveis gemidos de passagem na idade, e retornou com os dois pés paralelos na sala, intacta. Pra ela era mais interessante abrir os fogos de artifício na casa, celebrar o que mais se ama – e quem sabe- depois construir um jardim – com lâminas e pedregulhos, do que resta. “O que é bom tem luz própria - explode”, bonito são os cacos. Os da casa dela, vooaram alto, caíram os pequenos asteróides nos telhados dos vizinhos – causaram buracos incendiosos. A mulher sorriu.

sexta-feira, 27 de maio de 2011

denso fim de uma vida inteira

Sentira palpitar por toda parte a possibilidade de enumerar, a partir daí, os aspectos ditosos de seu destino, já que afinal, era B. que ali engenhava poços salgados entre as geometricidades dos olhos, já que era B, no auge dos seus 30 anos, o homem poliglota das perfeições, o papiro delicado onde tratava a vida com serenidade, que segurava sua mão, escorado em joelhos, de um jeito sonhado à pino antes das manhãs. Olhava para o teto, fugira a atenção falsificada aos encontros das paredes, como quem não escutara o que ele dissera a pouco, já pensava em Santa Teresa, o verdinho da Serra, pimenta caseira e o entardecer de ser exposta às dubiedades das circunstâncias de ser jovem (essa indolente batalha que não sabe ela, mas vive e morre atrelado ao fim como lógico da instância ser). Era pequena ali, ainda, tão pequena. A casa transformou-se em um mar de elaborações, prédios de raciocínios construindo-se e desaguando, ondas, onde havia duas saídas: atacar-se a uma bóia da embarcação ou partir rumo ao longe apenas com as forças dos braços, e se fosse o fim, que não chegasse quando ainda em suspensão. E naquele momento que dura até hoje, era quatro de Julho de 1991, peixes erravam sua correnteza no Índico, uma potência débil ia pro espaço dessa vez não literalmente, e aquele homem era tudo menos uma embarcação à vista. “Ele era, aliás, Bernardo Fonseca, sinto lhe dizer sob nossas impossibilidades, mas até hoje, você é uma ilha .”
Não é ela dessas que cultiva conchas ao invés do som vivo do mar.

Carta aberta a Instituiçã Afonso Forte

Carta encontrada na avenida João dos Passos, endereçada a Instituição Afonso Forte. Estava na companhia de um corpo não identificado, falecido após um letal ataque de pancreatite aguda.

1. Primeiro, não quero falar da fuga. A iniciar, porque não fui eu que tomei a decisão (eu e Alberto conversamos, por esses dias que aparecemos juntos, sobre não aliar-se a essa idéia). Segundo, mesmo eu sendo de formação religiosa, sempre confiei na ciência, portanto nos psiquiatras, representantes dela nesse meio, e assim sendo, confio no trabalho e coerência de vocês que resultará na subtração desses animais, desculpe-me o termo, que tanta atrapalham minha vida dedicada a benção do senhor (principalmente Sofia, a destrambelhada revoltada que me faz acordar com enxaquecas terríveis, estômago deteriorado e um odor significativo de cachaça). O que muito me piora o pouco tempo que tenho quando eles não estão aqui. Não sei onde estamos agora, provavelmente Sofia estava desenhando, há tintas nas minhas mãos, estou
2. Puta que pariu, essa vaca sempre se metendo aonde não é chamada, minha cachaça, que cana o quê. To parando to parando, eu disse e parei. Fugi, faria de novo, caro Doutor, rogo uma atençãozinha, é minha filha senhor, não a veja há dois anos, e que vontade me dá, não fumo não bebo, só fujo, mas é pra ver meu benzinho...o doutor deve entender, porra, deixa eu ser clara aqui ó, não deixam entrar crianças na desgraceira do manicômio! Nossa, olha o Alberto. Bota velho nojento, bem pior que eu. Repugnante, sempre fumando um cigarro atrás do outro, amarelo de nicotina. Quantas vezes eu acordei com a minha perna, sabe, aquela que é ruim, manca, por causa do acidente, doendo demais, descansando embaixo do que? Da virilha do Giocondo! O esquizofrênico do quarto 46, nu, ai, imagina eu, com aquele cheiro de bunda de homem por tudo, a coisa branca empedrada nos pelos, como é possível esse maldito do Alberto, viado, velho e cleptomaníaco e ainda, pai de dois filhos, tantos ícos a mais para adicionar ao dicionário de distúrbios, e a outra frerinha toda louca também, apaixonada pelo padre, mal-comida, entende porque eu bebo, alias, bebia doutor, você entende o que

3. Dependendo não sou eu que mais quero essa fuga. Vou ser sincero, estou à beira da morte. E a sua instituição sempre me tratou tão bem. Adoro o uniforme branco, o desinfetante de violetas nos cantos do banheiro, os bailes festivos, tudo. É tudo que sempre sonhei para minha vida, não trabalho, durmo a vontade, converso, jogo Damas. E ainda por cima, não gasto um tustão, os meus filhos que arcam com os custos dessa boa vida. Eu não sou culpado por me divertir, Giocondo, por exemplo. Aconteceu tão rápido, é claro, é contra às regras e tudo. Eu tentei evitar, mas ele está obcecado. Antes me dissera ser esquizofrênico, só agora descobri na sua ficha que está internado na clínica por ser obsessivo-compulsivo. Foi um erro Sr. Ivan, um erro. O homem está atrás de mim, fiquei com medo, eu e Sofia então cheg

1. com dificuldades para identificar esse lugar. Nunca fiz nada de mal a ninguém, sempre me privei da liberdade mal utilizada pelos mortais comuns. Isso não é justo, deveras. Adoro a casa Afonso Forte, melhor que aí só a casa de Deus

2.eu quero dizer. Casa de Deus? Você pode adivinhar porque né...o padre Leopoldo ainda trabalha lá é? Tarada pelo homem de saia, pro inferno essa doida.
3. ou para mim com essa idéia, topei na hora. É medo. Nix até sabia, mas nada poderia ter feito além de rezar. Além do mais, eu fervia de raiva dela desde que desatou a utilizar água benta em tudo. Minhas roupas encharcadas, assim não dá. Mas como é difícil essa vida Doutor Ivan. Nesses meus 70 anos, vivi e não vi tudo. Até viver com Sofia e Nix, tudo bem. Eu me dou bem com mulheres, apesar das outras diferenças. Você não imagina o que é viver com essas duas, engraçado às vezes. Outras, apenas dolorido. Nesses dias eu estava fazendo a barba, está certo que quase não tinha pelos em minha face. E não é que eu lá, com o rosto ensaboado e a lâmina na mão em ascendência vertical apaguei e Nix veio no meu lugar? Nem preciso dizer que a freirinha gerou galhos de sangue na minha face. Doeu por uns dois dias, terrível.

1. as pessoas nos tratam com bondade, há bolachas recheados nos cafés da manhã e sala de jogos nos finais de semana. As enfermeiras são de dar gosto de ver, atenciosas e tudo, acho até que estou enfim curada (aliás, nunca soube bem o motivo da minha internação, ninguém me explica nada, eis aí minha crítica). O que eu sinto falta mesmo é de uma capelinha menor, mas é a vida. Podiam pelo menos colocar alguma imagem de um santo, alguma coisa assim, um ícone do filho Jesus. Esta aí outra coisa chata, sabemos que a capela tem que ser laica (pode isso?), porque cada um dos internos tem uma religião né...mas por favor, organização! Esses dias eu estava fazendo uma benção e ao meu lado um desses envagélios exorcizava uma criatura. É necessário a construção de uma agenda, por Deus... Mas falo muito. Deixe-me contar tudo, o que realmente importa, sobre essa fuga desalmada que me forçaram a participar. Bastou a enfermeira Inês cair no sono para Alberto pegar suas chaves e abrir a porta principal, o senhor sabe, estava tudo escuro, foi na última madrugada. Jones, aquele guarda carrancudo, escutava seu MP3 enquanto lia algum gibi que havia por lá. Passamos despercebidos pela porta da frente. Daí, encontramos uma janela aberta, depois fomos ao pátio, onde enfim Sofia nos pulou rumo a calçada no outro lado da cerca. Foi simples assim, vocês tem que tomar alguma atitude. Estou com medo, não trouxe nada, nem os escritos com a palavra de Deus. Por favor, venha nos buscar.

2.Estou com dois doidos aqui doutor. Digamos que tenho meu manicômio particular, dentro desse corpinho. Não agüento mais Alberto e Nix, e claro você me diria “então volte para a Clínica Sofia! Iremos tratar você...”. Mas nós dois sabemos que não funciona assim. Na Clínica como você fala (é interessante você se referir a aquele lugar assim, bando de malucos), tem dias que eu fico dias sem aparecer. E tenho que escutar toda merda que Alberto e Nix aprontam, filhos da mãe, nem lembro donde vieram, um dia apareceram lá e deu, fodeu tudo. O velho me deixa fedendo a colônia de homem e fumo de palha e a freirinha, comendo doces sem parar, brancos, negros e cajuzinhos, essa aí ainda vai me dar uma diabetes...

3.Que coisa, a pessoa que quer liberdade é considerada louca hoje em dia. Tá certo que eu Nix e Sofia não somos os mais normais, mas nós acertamos poxa. Apesar de tudo a gente vive, mas te garanto Doutor Ivan, o meu lugar é na rua, e o delas também...ninguém pode viver dentro dessas paredes para sempre. Como eu te disse, gosto muito da sua Instituição. Mas fico com pena das meninas, aprisionadas nessa casa cheia de biruta...nos deixem em paz, por favor.

4.Caro Dr. Supervisionador, não sei quanto tempo que tenho para escrever antes que eles voltem. Por favor me tire daqui, não aguento mais eles na minha cabeça.
Assinado Juarez Osório (CPF: o verdadeiro dono desse corpo).

terça-feira, 17 de maio de 2011

a memória dos peixes

Estrofe diária: deixa sonho dissolver com vida. Te antena mas não te apega nos corrimões dos gestos. Tá todo mundo assim, descalço e mendigando seilá o que. Esperança. Noite fiada com amor emprestado.

E olha só para ti, comédia pública, pílula de chilique, todo exibido, nariz turbina, mãos a desenhar castelos nos ares. Te escuta seu patético. Tu fala é bem assim “então ele fez café e ainda me serviu café!”, gira a essa tua careca pro lado avulso de público, e dispara olhares ao infinito cor azul, assim bem airjet “ele me perguntou se eu estava casado”, tu esbraveja, ignorando os calos, a corcunda da busca por misérias, “me sinto a gostosa, foi melhor noite da minha vida”. Os calos não são músculos, não precisa exercitar. Sacode, isso e esquece. Que nessa era não há mãe de santo que não enxergue sintoma. Nosso amor foi cheio para estourar rápido. O nosso amor foi a sombra de um vaso bonito, uma sobra que só nos aumenta quando escuro. E a ressaca, lembra, anos 80 e pés na bunda. Saí daqui. Deixa de cantinho um crédito de aventura. Nossas cruzadas, planejamentos uivantes se desfazendo nem um laço de sapatilha e você construindo pontes só presas de um lado. Vítima de hipótese de absurdo, mais uma dessas credores da lama. E as portas na cara, e os sonhos molhados, os caixões pré moldados, as fases azuis, anis de bordeis. Está tudo aí, no cantinho da bochecha, nas venesianas dos olhos.

Você olha para ele e pensa como será que irá me matar, logo que eu que na décima tentativa já parei de contar, você pensa, como será que ele vai me matar. Tão lindo esses olhos, no escuro são verdes, no claro dá medo de olha no fundo e não encontrar o fim. Você sabe. Planetas são presos sem se enxergar, todos sabem da fama do cabo das tormentas, todos sabem como é grande o lixo nas ruas no dia seguinte ao desfile de carnaval. Lantejoulas são percevejos. Mas não adianta. Agora já planeja ele inteirinho, férias no Líbano, cruzeiros e peças de teatro nômades – sempre com fundo terno e maquiagem de boneca.

Correio. Expediente das moscas. É dezembro percursor de finais, mas é imbatível, você não se rende – quer recomeçar. Quem é a roda pintada obdecendo o sistema dos muito sensíveis e pouco céticos? É você. Que assina planilhas e pensa. Um sofá, uma cama, uma rede, um chão. Que pensa manhã, tarde, de noite, madrugada. Juntos pela Castro Alves, tomando conta das melhores piadas e cantando dias calmantes. A o peito ralo, as falhas da barba cuidadosa. Reações a mudanças, reação á noite mal dormida. Carinhos matinais, espátulas de eu quero. Você imagina e excede o terreno reservado da compreensão. A vida gigante te levando de desbravador, assim, logo tu. Que recorre ao tempo para tira-macha, que aterrisa em pista molhada por ódio ao controle, que nessas tantas já´deve até ta cobiçando livros de história.

Não te ensinaram a vida só tira o que se carrega. O que de corpo importante dá alvo grande. É cabuloso a governança dos teus olhos amáveis ao que desobedece mas sabe amar no seu vernáculo, sabe tudo. Um sábado, uma semaana qualquer de tocha, de combustível negro, vem ao meu apartamento e chora. Arranhado por dentro, lava tudo com uma queda de água salgada que tem poder de marés a ilhar-me a razão. Não me pergunte porque. Aconteceu. Os dias estão todos submersos em exatidões, não se pode dormir em casa sempre. E continua. Fui tanto, fiz mil, só pra ele. Abaixei a cabeça, no mansinho do cinema, perdi a cena do bejo, para olhar o amor pelos olhos dele. Tantas vezes. Escureci cedo, tanto corpo, tanto gasto - quilômetros e quilômetros no seu interior, reunindo as perguntas que faltavam para ser meu todo meu. Você queria ver algo se acabar. Ascendo algumas velas, falo de Madalena, do que não deu no jornal, desconto tudo na barriga do pecado atrasado. Você mansinho atira e erra, porque mira com os olhos, diante ao nada. Escuta tudo feito pirâmide. Longos dedos segurando meus braços, rota de conforto, de confiança na natureza. Pego um inscenso, pego uma garrafa de vinho, pergunto – quer sair. Você quer o poder de uma pedra. Diz que não melhor seria, Dolores D., conhaque. Sólido, dentro de si. Sentir as rotas do sangue e se despacho pelo peito. Os cavalos fazendo sinfonia com os metais resultantes dos respiros dos pulmões. Abaixa a cabeça, entende que quer calor. O meu, só pra não errar, de novo. O meu, não um novo.

Era já um homem bonito, mas querendo se curvar as lerdezas. Me recitava sobre o amor de cantinho, citava Lorca, Wilde. Falava de tentação como quem risca o fósforo pela primeira vez. André Gide. Não me culpa pelos cubos de gelo: sabe, naquela época, que me protejo esvaindo. A solidão é uma manhã eterna e sem filtro, sol refletido no gelo. Conta de amor. Eu rio encharcada, uso seriedade para manter em segredo. Vejo uma criança. Brilhante por um desafio, uma queda, uma pequena mordida que o faria refém, de algo, de alguém, de um querer mansinho que conquista sem perceber, a sala, todos os móveis, vira a casa. Lembro de te ver, alegre daquela maneira era tão estranho e desculpa por dizer que era sim muito estranho sorridente, leve, saltialtos “isso vai passar”.

Eu entendo que você levante cedo todas manhãs, nunca tire a chaleira do fogo. Dói ver numa felicidade uma descida. Tu é leve demais pro ar. Passa mundinho passa. Mas não me fala de amor. Me mostra tua alegria, não me conta um triz. Não me conta de um dois.

Eu que já decorei os endereços dos quais tu importa teus pedaços, eu que com minha linha costuro as partes que faltam.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Trecho "Passado numa sala"

“Amei Afonso porque nele nada gostava e nada concordava e nada dávamos certos, porque brigávamos no primeiro café, e no último biscoito, porque nos amávamos em todo lugar, e era ele o único que sabia lidar com meus distúrbios sintomáticos de perda de identidade de oscilação ideológica, que me chamava de louca, seguido de, é disso que eu gosto.Amei Cler porque ela dizia me amar, e aos poucos via muito, me sentia grande e ela com os únicos braços capazes de me confortar, de rir do meu sem graça, de botar graça nos dias sem piada.Amei Jaime pela sua cabeça, e Túlio pelo seu corpo, amei os dois por curiosidade e vontade cedida pela bebida e sei lá mais. Amei Marcos por que até ele eu não sabia qual a graça de ter uma cabeça sem perdê-la porque antes dele não amei nem a mim mesmo, porque foi o primeiro que jurei ser o último.Amei Júlio porque eu nada era, a não ser os desencontros que me moldava e penduravam na parede à venda, amei pelas suas cartas derretidas seu humor contido, seu peito inflamado, pela sua arte, pela arte que me fazia e fugia, amei Penélope porque fugia de mim e me queria ao mesmo tempo como nunca vi antes, porque tive de conquistar cada parte do corpo, e ao chegar no seu coração o meu já estava a tempos tomado.”